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1 de março de 2009

Alice Vieira foi entrevistada por alunos de 9º ano !

ENTREVISTA A ALICE VIEIRA




Pergunta: Pela pesquisa que fizemos, soubemos que foi jornalista e, agora escritora . A profissão anterior influenciou ou influencia a sua profissão actual?
Resposta: No jornalismo nós temos de ter uma escrita contida, e isso ajuda-nos imenso... Por outro lado, ouvimos sempre uma história que se relaciona com o nosso quotidiano , há sempre uma testemunha ocular que nos conta como tudo sucedeu e essa matéria pode ser importante para o livro que estamos a escrever.
P: Sabemos que só frequentou a Escola pública no momento em que devia iniciar o ensino secundário.Isso trouxe-lhe problemas de relacionamento?
R: Bom, só frequentei o liceu aos 10 anos, mas nessa altura, penso que a minha tia só me deixou ir, porque pensou que eu não ia gostar. Ora, de facto, eu estava ávida por conviver com meninos da minha idade – foi a minha libertação do "corredor muito comprido" que tinha sido até então a minha vida.
P: De que modo as suas vivências influenciam a sua obra?
R: A minha infância sempre tão fechada, rodeada de gente muito mais velha.
P: O que sentiu quando recebeu o prémio com o seu 1ºRomance "Rosa, Minha Irmã Rosa"?
R: Foi engraçado ! Todos nós quando queremos arranjar um culpado para as aventuras em que nos metemos... É cómodo, é fácil, a gente aponta e diz : « foi por causa dele».Pois eu também tenho um culpado: posso espetar bem o meu dedo indicador e dizer:O culpado foi ele. Ele é que me levou para esta vida ...Neste caso o culpado foi ela. Acho que se não tivesse sido a queixa da minha filha , já lá vão uns sete anos, eu não me teria metido nisto... Portanto, a culpa foi toda, toda dela!Um dia a Catarina chegou a casa, atirou com a pasta da escola para cima da cama, e disse :Já li todos os livros que há para ler.Fez uma pausa e disse :E agora, o que é que leio ?A Catarina tinha então nove anos, lia muito : não evidentemente, todos os livros que existiam, mas todos os que habitualmente se davam a quem tinha a sua idade.E agora?- repetia ela, com ar solene que arranja nas ocasiões difíceis... Eu ia tentando dar uma ajuda (lê este, e mais este, e mais aquele ) eram tudo ajudas inúteis (já li, já li, já li...). Foi então que dei comigo a dizer-lhe:Então, se já leste tudo o que há para ler, vamos nós as duas escrever um livro!Meti papel à maquina e do bater dos dedos nas teclas saiu esta frase: "Quando a minha irmã nasceu o meu desapontamento foi tão evidente que a minha mãe, abafada entre lençóis e cobertores da cama do hospital, me disse: Ela vai crescer num instante!"Olhei para a frase, uma, duas, muitas vezes, e a partir dela outras vieram, e mais outras, até que o primeiro capítulo do livro estava feito. E cada capítulo que nascia era lido e discutido com a Catarina, feliz de participar naquela aventura...E nunca mais parei. Tudo por causa da Catarina. Que hoje continua a ler tudo o que escreve muito melhor do que eu .Então, quando vi no jornal que ia haver um concurso literário resolvi enviar aquela história ( Rosa , minha irmã Rosa) que já estava entretanto, na gaveta, bastante tempo depois tive a comunicação de que aquele livro tinha sido o escolhido, fiquei contente e o prémio dividi-o com os meus filhos e fizemos em conjunto uma viagem à Grécia, aliás inesquecível.
P: Que oportunidades lhe deu para a sua profissão de escritora?
R: Bom, a oportunidade que eu tive foi, evidentemente, a publicação do livro, o que , aliás foi muito bom, pois é sempre muito difícil conseguir-se publicar algo. A partir daí recebi imensos convites para ir a Escolas, para ser entrevistada pelos alunos e também para participar em oficinas de escrita.
P: Quando recebeu o 2º prémio que a distinguiu, mais uma vez, como escritora, sentiu as mesmas emoções que sentiu quando recebeu o 1º prémio?
R: Quando recebi o 2º prémio não esperava foi com a obra: "Este Rei que eu escolhi", havia um júri presidido pelo Prof. José Hermano Saraiva que seleccionou o meu livro de entre todos os outros e então, foi o próprio professor que me telefonou a informar-me.
P: Os títulos das suas obras são curiosos e sugestivos. Costuma escrever as suas obras partindo do titulo ou este só lhe ocorre no meio ou mesmo no fim da obra?
R: Ora, escolher o título é difícil, por vezes já tenho entregue a obra ao editor e ainda não escolhi o titulo, nalguns casos, não, há por exemplo frases que se repetem ao longo da obra e que acabam por soar bem como título e, então, é assim que acontece. Portanto, normalmente a história é escrita primeiro e só depois escolho o título, porque , como disse, é sempre uma tarefa difícil .
P: Porque versa, frequentemente, nas suas obras, assuntos do nosso quotidiano?
R: Claro que o que é difícil é a vida de todos os dias, logo logo partir do real para o fantástico não é tão difícil. Por exemplo, como vou, frequentemente a Escolas e continuo a participar em oficinas de escrita, aconteceu-me um dia estar dentro da sala de aula e eis que chega um aluno que se tinha atrasado e diz: - Desculpe, mas atrasei-me a atar os sapatos. Ora, esta frase aproveitámo-la logo para tecer a história que precisávamos na altura.
P: Era jornalista antes do 25 de Abril. Como convivia com a censura?
R: Bem, o convívio com a censura era de facto complicado, mas, simultaneamente, o convívio com a censura também facilita a nossa escrita, pelo treino ou pela prática . Durante a censura era frequente nós utilizarmos sucessivamente metáforas e segundos sentidos, ou seja, subentendia-se ou lia-se nas entrelinhas. Ora tudo isto não facilita, depois, quando queremos escrever outras coisas. Por exemplo no tempo do Estado Novo não podíamos referir-nos a Angola, Moçambique, Guiné como colónias, mas sim como províncias. Lembro-me, por exemplo, que a primeira página de um jornal foi toda cortada pela Censura, então no jornal do dia seguinte, a primeira página só tinha receitas de cozinha.
P: Qual é o objectivo da sua obra "25 a 7 vozes"?
R: Eu só quis dar ideia do dia-a-dia das pessoas antes do 25 de Abril, e olhem que não era fácil, porque , muitas vezes, até o telefone era vigiado, portanto os condicionalismos eram muitos.
P: Porque deu voz apenas aos entrevistados?
R: Quando o fiz quis dar-lhes várias visões diferentes, pois cada um conta a sua história e, depois, porque não fazia sentido que aparecesse a minha voz.
P: Porque escolheu entrevistados das 3 gerações vivas?
R: Pelo motivo já indicado, pois queria que dessem o seu testemunho daquela altura estando vivos, obviamente, o que dá mais credibilidade à história.
P: Quais são os seus escritores preferidos?
R: Os meus escritores preferidos são vários, começando por Eça de Queirós; Vaz de Camões; Cesário Verde – gosto muito de Cesário Verde - ; João Cabral de Melo Neto ; Agustina Bessa–Luís; Lobo Antunes, entre outros .
P: Acha que a sua escrita é influenciada pela sua leitura?
R: Não sei, mas espero que não seja , não copio, não sigo o estilo de ninguém. Agora, é claro que quem lê muito vai sempre ficando alguma coisa que é provável que passe para a escrita .
P: Quais foram as obras que leu na sua infância? E se fosse hoje, quais das suas obras gostaria de ler?
R: Li muitos autores Brasileiros e adoro Erico Veríssimo, pois a sua obra «Clarissa» é uma obra bela e sem idade, aliás, eu já tenho esta obra lá em casa guardada , para a minha neta ler quando for altura, pois só tem agora 5 anos .
P: Só conhecemos uma obra dramática "Leandro, Rei da Heliria", escreveu mais alguma? Pensa escrever outra?
R: Esta obra foi-me encomendada pelo Carlos Avilez, Director do Teatro de Cascais e foi feita "em cima das tábuas", ou seja, no próprio teatro, lembrei-me então de um conto popular que lhe serve de fundo e saiu esta obra.
P: Para escrever bom teatro é obrigatório: "passar pelas tábuas" , isto é , representar, encenar ...?
R: O teatro publicado sem ser representado não vale nada.
P: Como escritora, qual é o seu género literário preferido? E como leitora?
R: Como escritora é de facto o género narrativo: « O Romance», como leitora é sem dúvida a poesia. Porque eu não sou capaz de escrever em verso, por isso admiro aqueles que o fazem.
P: Qual foi o livro que mais prazer lhe deu escrever?
R: Todos , embora diferentes. Estou a lembrar-me da "Espada do Rei Afonso"; "Este Rei que eu escolhi" ou o Promontório da Lua, que embora me tenham obrigado a fazer alguma pesquisa, me dera prazer escrever.
P: Qual foi o livro que a obrigou a fazer mais pesquisa?
R: Em 1994, Lisboa foi escolhida como Capital Europeia da Cultura. Então, eu escrevi um livro a propósito com mais ou menos 500 páginas. Em 1998, para a Expo 98, pediram-me que escrevesse um livro sobre as mais belas praias de Portugal. Lembro-me que precisei de escrever sobre uma praia recôndita no Norte de Portugal e, então, desloquei-me ao local, entrevistei os pescadores, fui à câmara, ao café mais próximo, para perceber o sentido daquelas vivências. Este livro foi, ainda, maior que o que escrevi para 1994 – Lisboa, Capital da Cultura.
P: Para escrevermos bem, o que devemos fazer?
R: Devemos ler muito e, sobretudo , bons escritores, depois devemos gostar muito de escrever e muito de ler, mas fundamentalmente, devemos ter muita paciência.
P: Para nós é extremamente gratificante o contacto com os escritores. E para si é gratificante o contacto connosco?
R: Muito mesmo, gosto muito de contactar com jovens como vocês.
P: Gosta mais de escrever à maquina ou a computador?
R: Desde sempre escrevi directamente na máquina. Computador, aliás, tenho um há muito pouco tempo e ainda não sei trabalhar com ele, mas à máquina, sim, faço-o sempre .


(Entrevista realizada pelos Alunos de 9º ano de escolaridade)






19 Janeiro 2009

Excerto de uma entrevista de Alice Vieira ao Público.

"No geral, as crianças têm muitas, muitas dificuldades. E os professores, logo à partida, têm medo que os alunos se cansem e nem tentam! “O quê? Dar isso? Eles não gostam, cansam-se”. Há um medo de cansar os meninos. Desde 1974 que os alunos têm sido muito cobaias da educação. E os professores e os alunos não sabem muito bem o que é que andam a fazer… Aconteceu uma coisa terrível é que tudo tem que ser divertido. Há duas palavras que me põem fora de mim: moderno e lúdico! Tudo tem que ser lúdico, tem de ser divertido, nada pode dar trabalho. Não pode ser!.

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